quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

XX - A OUTRA FACE DE MINHA VIDA



Minha vida tomou outro rumo, mudou completamente, logo, meus negócios também. Ventos deveriam levar-me para algum outro destino. Não contrabandeava e advogava como dantes. Hermengarda foi quem assumiu tudo sozinha. Deus a tenha num bom lugar. Infelizmente seria mais uma a me abandonar... e pior, por causa de mim mesmo.
Senti-me muito solitário. Hermengarda, aquela doce ladra, mesmo com a idade em suas costas, mantinha-se junto a mim e dos negócios. Não aguentava mais minha mesquinha vida burguesa e de frequentar os mais diversos bordéis atrás, totalmente bêbado, das mais diversas meretrizes possíveis. Estava cansado disso tudo quando uma luz me alcançou. Absorto em alguns pensamentos, após as afetivas perdas humanas, e a me entregar mais ainda à bebida, tive uma formidável ideia. Contratei alguns homens para que no porão de minha casa construíssem um discretíssimo recinto para jogatinas e encontros. Pensei eu: por que não ter o meu próprio salão de saraus e meu “inferninho” para em vez de frequentar o de outros, isso renderia muito mais ao meu bolso.
E assim, pois Deus e São Francisco escutaram as minhas preces, tudo aconteceu e durou algum tempo.
Eu vivi na antiga rua da lama, que hoje, na Bahia, é a rua, se não me encontro equivocado, chamada de Camucan, em Nazaré das Farinhas, lugar de muita miséria. Muitas mulheres de lá com suas crianças cadavéricas, mas com barrigas gigantescas, misturavam areia fina à farinha para render e alimentá-las. No final dessa rua tinha a Igreja de Bom Jesus. Minha casa era de altos e baixos, com um porão onde recebia toda a corte. Embaixo era uma casa de jogos, na qual se encontrava tudo que se pode imaginar. Em cima, na minha casa realizava saraus e mais saraus, enquanto aquelas mulheres podres, porcas e imundas da corte, que nem gostavam de tomar banho, tinham constantemente seus maridos, que muito pouco as procuravam, em meus porões para estar com outras mulheres, com outros homens ou com pederastas. Como essa corte era fedida e imunda! Já viste alguma figura em que um nobre estivesse sorrindo? Obviamente que não; acredito que sejas sincero, pois a nobreza não tinha dente. Entrementes, em relação a essa minha empreitada, não pense que era enorme, pois a minha cidade era pobre. Recebia muita gente de fora.
Muitos dos pederastas que se casavam só procuravam suas mulheres no dia do casamento, porque eram obrigados. Assim que elas dissessem que estavam grávidas, eles não as procuravam mais, porque a Santa Madre Igreja dizia que uma mulher grávida não poderia, em hipótese alguma, manter nenhum ato sexual com seu respectivo marido. Logo, ela poderia saciar-se com quem não fosse seu marido, livrando-o da obrigação de ser homem para uma mulher. Quando ela, muitas das vezes, levantava-se da cama, do resguardo – se a criança concebida fosse homem, ficaria quarenta dias deitada; se fosse mulher, permaneceria trinta dias -; já se encontrava grávida, pois mais uma vez tinha sido possuída de uma maneira grossa, estúpida, violenta, imoral, indecente, sem ter o mínimo direito de suspirar. Muitos daqueles porcos só sabiam desabotoar suas braguilhas que eram um pedaço de pano que tombava para frente. Eles as penetravam praticamente tendo orgasmo. Após, largavam-nas. Percebe, caríssimo... aquelas mulheres se encontravam ali deitadas como um balde de excremento esperando ser usado, e nem banho esses porcos tomavam, mas era para os porões que eles iam. Os que realmente eram homens procuravam as negras ou até as brancas que eram da “minha propriedade”, os outros, os pederastas, procuravam os homens para se realizarem dominando-os ou sendo dominados sexualmente.
Andei muito pelo mundo. Estudei muito também sobre culturas. Descobri sobre casos de homossexualismo como prática normal de uma sociedade. Ou como doença mental. Li que, por exemplo, na Grécia antiga isso era totalmente comum. Quando os homens iam para guerra, não levavam suas mulheres. Logo, como esses homens se serviriam sexualmente durante tanto tempo longe? Aquiles, Pátroclo, Alexandre, o grande. Esses grandes e viris guerreiros serviam de si mesmos ou de rapazes que tinham seus escrotos retirados para servirem sexualmente nas longas viagens. Agora, esse conceito não deve ser concebido à luz do pensamento atual ou cristão. Não são os homossexuais que conheci em vida. Nesse terra vi muita covardia, embora não pudesse fazer nada para ceifá-la. O negro escravo, por volta de seus quatorze anos ou quando atingia a maior idade, tinha sua bunda exposta numa mesa para que tirassem-na a virgindade. Os jovens filhos dos donos da fazenda enrabavam-nos que eram presos para isso. Negras também eram oferecidas para outros com esse fim. Se possuísse feições bonitas, se fosse esguia, era estuprada como direito. Algumas eram até mutiladas ou assassinadas por causarem inveja a mulheres brancas. O europeu adorava isso, a violência e a  promiscuidade. Não participei dessa podridão. Os negros que deitavam com os brancos em meus porões eram homossexuais, sentiam atração física e estética por outro ser do mesmo sexo. Mas se deitavam para sobreviver, ter principalmente o que comer. No meu tempo e no meu espaço, homem que tem prazer sexual com outro homem não é homem; é sodomia, é patologia. E quantos grandes homens foram mulheres!
Todas as mulheres de baixa meretriz e pederastas que pediram minha ajuda, eu, João Paulo da Costa, os acolhi. E foi uma mulher nobre que acreditou que me faria de bobo. Idiota é aquele que pensa tudo ser muito fácil.

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